Correio dos Campos

Filho tira o pai do vício no crack depois de conhecê-lo aos 19 anos

11 de janeiro de 2020 às 16:49
(foto: Arquivo Pessoal)

O brasiliense Leonardo Pereira Roque conheceu seu pai vinte anos depois de ter nascido. E logo de cara o soldado do Exército teve pela frente a missão mais importante de sua vida: tirar o pai, Orlandino Ferreira Rock, do vício no crack.

O militar sonhava em descobrir a própria origem e ter o nome do pai nos documentos, principalmente depois que a mulher dele ficou grávida. Leonardo foi criado pela avó materna. Um dia, ele pediu a ela o nome do pai e quis saber como foi a relação dele com a mãe.

Ele descobriu que os pais eram colegas de escola e tiveram um romance rápido. “Aí eu fui à escola e consegui conversar com a diretora. Expliquei minha situação, e ela me deu o endereço da casa dele. Só que ninguém morava mais lá, porque meus avós paternos morreram.”

Leonardo deixou seu contato com uma vizinha e aguardou. Três semanas depois, ele voltou ao local e recebeu uma surpresa. O pai, que é vigilante, tinha passado por lá e deixado um número de telefone. A mulher deu forças para ele ligar e abrir o coração. “Falei: oi, meu nome é Leonardo, e tem 20 anos que você teve um caso com a minha mãe, Aparecida.”

Pai e filho marcaram de se encontrar no dia seguinte e planejar o teste de DNA, que confirmou o parentesco. Dois meses depois de conseguir colocar o nome do pai nos seus documentos, o jovem atendeu uma ligação: no outro lado da linha, estava a madrasta dele, convidando-o para um almoço.

“Fizemos um almoço pela manhã para eu conhecer a família, e à noite a esposa dele me ligou e contou sobre o vício em drogas. Fiquei muito triste. Eu pensava ‘acabei de conhecer meu pai e posso perder ele’. Imaginava como ajudar, mas também não tinha muito conhecimento nem intimidade com ele.”

Leonardo descobriu que o pai já era viciado antes mesmo dele nascer. O vigilante começou com maconha, merla, e depois partiu para a cocaína. Por causa do preço da droga, ele migrou para o crack. A madrasta estima que ele já chegou a gastar R$ 35 mil em único mês comprando entorpecentes.

Leonardo tentou de tudo para livrar o pai das drogas nos últimos quatro anos. No meio do ano passado, ele deu um ultimato ao vigilante. “Eu falei assim: ‘olha, se você não for para a clínica, vai perder mulher, vai perder filhos, porque eu não vou correr atrás mais. E eu vou lá na boca, e a gente vai usar a droga juntos’. Essas palavras foram muito fortes, acho, porque ele não queria para mim a vida dele. Então ele aceitou ajuda”, contou.

Atualmente, Orlandino Ferreira Roque faz tratamento na ONG Salve a Si. O pai do militar ganhou um ano de tratamento, menos do que o tempo médio estimado, cerca de seis meses. No local, ele realiza plantios e obras, para manter a cabeça ocupada. O vigilante também faz cinco refeições por dia.

A rotina na ONG é baseada em três pilares: trabalho, terapia e espiritualidade. “Eles têm também, na reinserção social, um professor agrônomo”, explica José Henrique França Campos, o administrador da ONG.

Nos primeiros meses, o contato com a família acontece apenas por cartas. Depois da adaptação, uma vez por semana, é autorizada uma ligação para a casa. Com três meses, os pacientes ganham direito de saída terapêutica uma vez por mês: saem na sexta-feira e voltam na segunda.

“Ele disse que não sente mais vontade de nada. Que ele quer aproveitar a vida, que passou muito tempo na destruição, na droga, e que agora ele quer aproveitar e quer fazer viagem em família. Sinto que ele está decidido”, contou Leonardo.

As cartas que o vigilante escreve para o filho são cheias de palavras de agradecimento, declarações de amor, pedidos de visita e lembranças à neta e à nora.
“Precisou passar 19 anos para um anjo aparecer e tocar o meu coração. Você filho, quando você entrou para a minha família, tudo mudou. Caramba quando você, Leonardo, falou aquele dia que se eu não [parasse] de fumar essa droga la em casa na porta você lembra? Você disse pai se você não parar eu vou usar junto com você, e eu falei Leo você ta doido? Não fosse isto, foi ai que eu decidir não usar mais (sic).”

Mas, a verdade é que o rapaz não se vê como herói. Leonardo acredita que fez o que qualquer filho faria no seu lugar. “Eu fiz o que estava ao meu alcance. E eu quero fazer o melhor para ele, quero ajudar”, finalizou.

Fonte: Razões para Acreditar