Correio dos Campos

As queimadas, as mudanças climáticas e um novo rumo para a economia

*Por Mariana Schuchovski - Vice-presidente do Comitê de Sustentabilidade da Amcham Curitiba (Câmara Americana de Comércio), Doutora em Ciências Florestais pela UFPR e NCSU (EUA), CEO e Fundadora da Verde Floresta | Consultoria em Sustentabilidade, Professora da FGV, ISAE, UFPR e Faculdades da Indústria/SENAI
20 de fevereiro de 2020 às 18:14
(Reprodução/Internet)

Cientistas da NASA e NOAA anunciaram nesta semana que a última década foi a mais quente da história, sendo que 2019 foi o segundo ano mais quente, só perdendo para os recordes de temperatura alcançados em 2016. Estamos assistindo aos incêndios na Austrália, de magnitude sem precedentes, com a morte de dezenas de pessoas e de milhares de animais, a perda de mais de 11 milhões de hectares de florestas, sem mencionar as perdas em biodiversidade e serviços ecossistêmicos. No ano passado, vimos mais uma vez os inúmeros focos de incêndio na Amazônia e também grandes extensões de incêndios em diversas regiões do continente africano.

Diante desse cenário, vemos que o mundo tem um novo rumo a seguir no que diz respeito às mudanças climáticas. Desta vez, por incrível que pareça, este caminho não foi traçado pelos governos, nem pelas Nações Unidas, mas sim pelas empresas.

Há alguns anos temos visto ações do universo corporativo em resposta à crise climática, e algumas empresas, sobretudo as de capital aberto, já possuem metas de redução de emissões de carbono e outros gases de efeito estufa (GEE).

Segundo o CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável), entre 2015 e 2017, diversas empresas brasileiras globais investiram mais de US$ 85 bilhões em projetos para a redução de emissões de GEE, envolvendo tecnologias de eficiência energética, otimização de processos e uso de fontes de energia de baixo carbono.

Contudo, ao que parece, o movimento se fortaleceu desde a última Conferência do Clima das Nações Unidas, a COP 25, que ocorreu em dezembro de 2019 na Espanha, para discutir os prementes desafios globais que as mudanças climáticas já representam para os países, para as instituições, para a sociedade e os habitantes do planeta.

Nesta oportunidade, 631 investidores de todo o mundo, representando cerca de US$ 37 trilhões em ativos, assinaram uma carta instando aos governos que intensificassem seus esforços para alcançar os objetivos do Acordo de Paris e enfrentar a crise climática global.

Ainda, durante a COP 25, acompanhamos a adesão de 533 Empresas B (B Corporation) à iniciativa chamada NetZero, comprometendo-se com a redução de emissão de carbono, atuando na liderança de plano de “carbono zero”.

E recentemente, presenciamos a influente declaração da BlackRock, o maior fundo de investimentos do mundo, de evitar investimentos em empresas que “apresentam um alto risco relacionado à sustentabilidade”. Na tão esperada carta anual aos seus executivos, Larry Fink, CEO e fundador, declarou que as evidências sobre o risco climático estão levando os investidores a reavaliar as principais premissas sobre finanças modernas, afetando desde títulos municipais a hipotecas de longo prazo para casas, e que “o aquecimento global provocará uma ‘reformulação’ da economia”.

Sim, estamos diante de um momento decisório e importantíssimo para a história das nações, em que viveremos a transição do modelo econômico atual para economia de baixo carbono. Ou melhor, para uma sociedade de baixo carbono. Nas próprias palavras de Fink, da BlackRock, “mesmo que apenas uma fração da ciência esteja certa hoje, esta é uma crise muito mais estrutural e de longo prazo”.

O que isso significa? Quase como um alerta, não há dúvidas de que partir de agora presenciaremos uma cascata de ações para a mitigação de emissão de gases de efeito estufa, com a conversão de matrizes energéticas, substituição de matérias-primas, alterações de processos produtivos, enfim, veremos o desenvolvimento de novas formas de se fazer negócio. Os resultados de uma organização serão medidos com indicadores que contemplem não só os aspectos econômicos, mas também os fatores ambientais, sociais e de governança (ESG – Environmental, Social and Governance, em inglês). Teremos o fortalecimento dos negócios sustentáveis, da economia circular, da economia de triplo impacto, e de tantas outras formas de se fazer negócios buscando equalizar o lucro aos cuidados ao meio ambiente e às pessoas (trabalhadores e partes interessadas), valorizando a transparência do proposito e da governança.