Correio dos Campos

Nova chance para os “contribuintes legais”

* Por Marco Aurélio Pitta - Profissional da área contábil e tributária, mestrando em Administração e coordenador dos programas de MBA nas áreas Tributária, Contábil e de Controladoria da Universidade Positivo
9 de dezembro de 2019 às 18:10
(Foto: Divulgação)

Os contribuintes foram surpreendidos com uma nova chance de quitar suas contas com o Fisco: a Medida Provisória 899/19 prevê a possibilidade de parcelamentos de tributos federais junto à União. Trata-se da “MP do Contribuinte Legal”. Essa possibilidade ainda depende de regulamentação e mais esclarecimentos práticos da sua adesão, mas é uma boa opção, dada a ausência de mecanismos que permitam alternativas para negociar os débitos de difícil recuperação.

São duas modalidades: uma para débitos que estão em dívida ativa, ou seja, já são devidos pelo contribuinte, seja pessoa física e jurídica nesta situação e inadimplentes perante o Governo Federal. Outra modalidade é para casos de contenciosos tributários. O Fisco deverá, por edital (modalidade por adesão), prever as teses abrangidas e as condições para adesão. Essa modalidade pode encerrar centenas de milhares de processos, envolvendo um montante superior a R$ 600 bilhões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) e R$ 40 bilhões garantidos por seguro e caução. As reduções, em ambas as modalidades, podem chegar a 70%. Mas seria essa uma boa opção para o contribuinte? E para o Governo, isso seria sustentável? Entendo que sim, mas com ressalvas.

A primeira justificativa se dá pelo fato da insegurança jurídica vivida pelas empresas brasileiras. Estudos do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) apontam que em nosso país são editadas cerca de 46 normas tributárias por dia útil. São mais de 60 tributos diferentes. Segundo o Banco Mundial (2017), o Brasil é o país no qual as empresas mais gastam horas para poder atender a todas as exigências tributárias. São mais de 1.958 horas por ano, em média.

A segunda justificativa leva em consideração o cenário de déficit fiscal vivido pelo Brasil há vários anos. O baixo crescimento da economia brasileira e a dificuldade de se aprovar reformas justificam a preocupação. A previsão de superávit fiscal, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), só deve ocorrer em meados de 2022. Por isso, a entrada de recursos adicionais no caixa do Governo pode fazer o poder executivo evitar novos contingenciamentos de recursos, como tem ocorrido ultimamente. Segundo o Ministério da Economia, esse programa pode alcançar 1,9 milhão de devedores, cujos débitos superam R$ 1,4 trilhão.

Por último, podemos citar um maior critério para concessão de parcelamentos. Diferente dos antigos “REFIS”, essa MP concederá benefícios fiscais apenas nos casos de comprovada necessidade e mediante avaliação individual da capacidade contributiva. Esse parece ser um novo paradigma no relacionamento Fisco e Contribuinte, baseado na cooperação e soluções consensuais de litígios, com redução de custos.

Temos uma cultura em nosso país de oferecer muitos refinanciamentos para os contribuintes. Muitas vezes, organizações acabam priorizando pagar funcionários e fornecedores e deixar para pagar os tributos por último – o que não se mostra uma prática sustentável e acaba sendo, muitas vezes, injusta para os bons pagadores. Mas, independentemente disso, não oferecer uma “segunda chance” para o contribuinte parece ser radical demais.